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SUS perdeu quase 42 mil leitos em sete anos, aponta relatório do CFM

MS foi o estado que mais sofreu com desativações; RR teve aumento.
Áreas mais afetadas são psiquiatria, pediatria, obstetrícia, cirurgia e clínica.
 
O Sistema Único de Saúde (SUS) desativou quase 42 mil leitos de hospitais nos últimos sete anos, revela uma análise do Conselho Federal de Medicina (CFM). Atualmente, o país tem mais de 354 mil leitos em todos os estados, mais o Distrito Federal. A redução, portanto, representa 11,8% do total em atividade hoje.
 
Os dados foram obtidos pelo Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, do Ministério da Saúde, e fazem parte de um relatório sobre os aspectos que dificultam o trabalho dos médicos no Brasil, como a falta de investimentos e infraestrutura.
 
Entre outubro de 2005 e junho 2012, Mato Grosso do Sul foi o estado que mais sofreu com a perda de leitos, com uma queda de 26,6%. Em seguida, aparecem Paraíba (19,2%), Rio de Janeiro (18%), Maranhão (17,1%) e São Paulo (13,5%).
 
As áreas mais prejudicadas foram psiquiatria, pediatria, obstetrícia, cirurgia geral e clínica geral.
 
Apenas seis estados apresentaram um aumento no número de leitos nesse período: Roraima (33,5%), Rondônia (23,6%), Amapá (9,2%), Pará (7,4%), Amazonas (6,7%) e Acre (2%).
 
‘Tendêncial mundial’
Segundo disse em nota o presidente do CFM, Roberto Luiz d’Ávila, “os gestores simplificaram a complexidade da assistência à máxima de que ‘faltam médicos no país’. Porém, não levam em consideração aspectos como a falta de infraestrutura física, de políticas de trabalho eficientes para profissionais da saúde e, principalmente, de um financiamento comprometido com o futuro do Sistema Único de Saúde”.
 
O texto afirma ainda que, na visão do Ministério da Saúde, a redução de leitos é uma tendência mundial, decorrente do avanço dos equipamentos e remédios que permitem tratamentos sem a necessidade de internação.
 
Apesar disso, o governo tem investido na criação de novos leitos hospitalares: no ano passado foram abertos 1.296 e este ano devem ser 1.783.
 
Segundo o vice-presidente do CFM, Aloísio Tibiriçá, as superlotações em emergências e pronto-socorros comprovam o problema. Para resolver a falta de leitos, muitas cidades fazem, de tempos em tempos, mutirões para cirurgias de média complexidade, como hérnias e hemorroidas.
 
“O Brasil tem 1,85 leito por mil habitantes. A Espanha, que apresenta um sistema de saúde parecido com o nosso, tem 4 leitos por mil. Estamos com uma defasagem de 340 mil leitos, ou seja, o número atual precisaria praticamente dobrar”, destaca.
 
Tibiriçá afirma que também seria preciso dobrar os investimentos em saúde pública em relação ao total do Produto Interno Bruto (PIB). Hoje, de acordo com ele, são investidos 3,6% do PIB no SUS – metade disso vem de estados e municípios e a outra metade, da União –, enquanto o ideal seriam 7% ou 8%.
 
Médicos por mil habitantes
O levantamento do CFM aponta também o número de médicos por mil brasileiros: 1,95, em média. Ao todo, 371 mil profissionais estão registrados no conselho em todo o país.
 
O Distrito Federal lidera a proporção de médicos por mil pessoas (4,02), seguido do Rio de Janeiro (3,57), de São Paulo (2,58), do Rio Grande do Sul (2,31) e do Espírito Santo (2,11). No fim da lista, estão Maranhão (0,68), Pará (0,83), Amapá (0,96), Piauí (1) e Acre (1,03).
 
De acordo com o conselho, 72% dos médicos no Brasil estão concentrados nas regiões Sul e Sudeste. Para que essa distribuição seja mais equilibrada, o CFM cita fatores como mais leitos e equipamentos, planos de cargos e salários e vínculo empregatício.
 
Na opinião de Tibiriçá, o médico vai para onde o mercado oferece melhores condições. Atualmente, há quatro postos de trabalho ocupados no setor privado para cada um na rede pública. E o número de faculdades só cresce: ocupamos o segundo lugar, com 196 escolas, atrás apenas da Índia, segundo o vice-presidente do CFM.
 
“É preciso tornar o SUS atrativo, com investimentos. Tem que haver uma política de estado, não de governo. Essas pendências estão se cronificando, igual a um doente que só piora”, compara Tibiriçá.
 
Ele aponta que nas emergências, periferias e regiões remotas do país, o médico não encontra qualidade, atualização profissional e hospitais de referência.
 
Entre os países com sistema universal de saúde, o Brasil tem o menor percentual de participação do setor público por habitante. Cuba aparece no topo, seguida de Suécia, Espanha, Alemanha, França, Argentina, Austrália, Reino Unido e Canadá.
 
Avaliação
Na opinião do médico Waldemir Rezende, consultor em assistência de saúde e ex-diretor do Instituto Central do Hospital das Clínicas de São Paulo, de 2002 a 2007, é preciso levar em conta vários aspectos ao analisar a redução de leitos no SUS.
 
Rezende aponta que o reflexo disso deve vir a longo prazo. E o governo deve tomar cuidado para não acabar tendo que construir hospitais “a toque de caixa”.
 
Segundo ele, realmente foram incorporadas novas tecnologias que permitem tratamentos ambulatoriais, como é o caso da quimioterapia para câncer e doenças autoimunes, como artrite e lúpus.
 
Além disso, as cirurgias estão mais modernas, como as minimamente invasivas, por videolaparoscopia. Antes, quem era operado de hérnia, vesícula ou do aparelho reprodutor, ficava até três dias internado – hoje, entra na sala de cirurgia de manhã e recebe alta à noite.
 
“Outra questão é a melhor capacitação dos médicos, que certamente ocorre nos grandes centros, como São Paulo, Rio e Brasília. Mas no Norte e Nordeste tenho sérias dúvidas”, ressalta.
 
O fato de a região Norte ter tido um aumento no número de leitos nos últimos sete anos, de acordo com Rezende, pode ser explicado por uma deficiência crônica nesses estados.
 
“O Brasil é um país continental, e o Norte está em uma fase mais atrasada, na qual o número de leitos não é compatível com as necessidades da população”, afirma.
 
Ao ser comparado com outros países e colocado em uma posição pior, porém, o médico diz que as dimensões do nosso território devem ser levadas em conta.
 
Sobre a concentração de profissionais, Rezende diz que, só na cidade de São Paulo, há um médico para cada 400 habitantes, principalmente na Avenida Paulista e imediações. Tanto que muitas pessoas de outros estados acabam vindo à capital paulista em busca de tratamento especializado, em hospitais como o HC e o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp).
 
O médico aponta, ainda, o aumento expressivo no número de cursos de medicina sem estrutura e treinamento, o fato de menos de 50% dos novos médicos fazerem residência e de mais de 50% serem reprovados em testes depois da graduação.
 
Por conta da alta concorrência no vestibular, com até 80 candidatos por vaga, muitos estudantes também acabam fazendo o curso em países como Bolívia, Paraguai, Uruguai e Argentina – e depois voltam para tentar se habilitar aqui.
 
“Quanto pior a formação, mais o profissional gastará recursos em exames e diagnósticos. Um bom médico, muitas vezes apenas com um exame físico e o histórico do paciente, pode saber o que a pessoa tem e indicar o melhor tratamento”, diz.
  
Fonte:Globo.com

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